terça-feira, 31 de dezembro de 2013


Feliz 2014!

Arte: Vladimir kush

Que você possa ter muitos sonhos,
Que se transformem em belos projetos,
E ao realizá-los sinta prazer e alegria,
Que estes sentimentos brilhem e
 seus reflexos  
Fertilizem outros sonhos!


E assim chegar e partir



Todos os dias é um vai-e-vem
A vida se repete na estação
Tem gente que chega pra ficar
Tem gente que vai pra nunca mais
Tem gente que vem e quer voltar
Tem gente que vai querer ficar
Tem gente que veio só olhar
Tem gente a sorrir e a chorar

E assim chegar e partir
São só dois lados da mesma viagem
O trem que chega
É o mesmo trem da partida
A hora do encontro é também despedida
A plataforma dessa estação
É a vida desse meu lugar


Milton Nascimento

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Diamante puro!



"E se o que tanto buscas só existe
em tua límpida loucura
- que importa? -  isso 
exatamente isso 
é o teu diamante mais puro!"

Mario Quintana

domingo, 29 de dezembro de 2013

Silêncios



Eu nasci para estar calado.
Minha única vocação é o silêncio.
Foi meu pai que me explicou: tenho inclinação para não falar, um talento para apurar silêncios.
Escrevo bem, silêncios, no plural.
Sim, porque não há um único silêncio.
E todo o silêncio é música em estado de gravidez.
Quando me viam, parado e recatado, no meu invisível recanto, eu não estava pasmado.
Estava desempenhado, de alma e corpo ocupados: tecia os delicados fios com que se fabrica a quietude.
Eu era um afinador de silêncios.

Mia Couto

sábado, 28 de dezembro de 2013



"Quem disse que eu me mudei?
Não importa que a tenham demolido:
A gente continua morando na velha casa em que nasceu".

Mário Quintana

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Cena sem ensaio

Imagem: Ann Mei

A vida na hora.
Cena sem ensaio.
Corpo sem medida.
Cabeça sem reflexão.

Não sei o papel que desempenho.
Só sei que é meu, impermutável.

De que trata a peça
devo adivinhar já em cena.

Despreparada para a honra de viver,
mal posso manter o ritmo que a peça impõe.
Improviso embora me repugne a improvisação.
Tropeço a cada passo no desconhecimento das coisas.
Meu jeito de ser cheira a província.
Meus instintos são amadorismo.
O pavor do palco, me explicando, é tanto mais humilhante.
As circunstâncias atenuantes me parecem cruéis.

Não dá para retirar as palavras e os reflexos,
inacabada a contagem das estrelas,
o caráter como o casaco às pressas abotoado -
eis os efeitos deploráveis desta urgência.

Se eu pudesse ao menos praticar uma quarta-feira antes
ou ao menos repetir uma quinta-feira outra vez!
Mas já se avizinha a sexta com um roteiro que não conheço.
Isso é justo - pergunto
(com a voz rouca
porque nem sequer me foi dado pigarrear nos bastidores).

É ilusório pensar que esta é só uma prova rápida
feita em acomodações provisórias. Não.
De pé em meio à cena vejo como é sólida.
Me impressiona a precisão de cada acessório.
O palco giratório já opera há muito tempo.
Acenderam-se até as mais longínquas nebulosas.
Ah, não tenho dúvida de que é uma estreia.

E o que quer que eu faça,
vai se transformar para sempre naquilo que fiz.

Wislawa Szymborska

(tradução de Regina Przybycien)